domingo, 24 de fevereiro de 2008

Muito Além do Frango de Barbosa

Descobri que a campanha de Barack Obama tem um aliado sobrenatural.

Tramando pela vitória do senador de Ilinóis está ninguém menos do que a perturbada alma do velho Barbosa, um dos grandes jogadores da história do Brasil.

Sei disso porque, recentemente, depois de ouvir um conhecido de longa data afirmar ceticamente que não há mais racismo no futebol brasileiro, visitei o terreiro de vovó Candinda e invoquei o espírito do injustiçado arqueiro da Copa de 50.

Para quem não se lembra ou nunca ouviu falar, o bom Barbosa aceitou uma bola que decidiu o Mundial, na tragédia do Maracanazo, sendo então crucificado por toda a imprensa brasileira - boa parte dela discriminando-o pela cor de sua pele.

Sem negar que saiu de campo com as penas na mão, a alma “penada” do famoso goleiro possui a preta velha e saiu atirando nos jornais da época: “Barbosa vergonhoso”, chegou a publicar em negrito um jornal reacionário. “Jair covarde, desapareceu perante a marcação de Obdulio Varela”, “Bigode, jogador irresponsável” e por aí vai. Mesmo depois de apagadas atuações de Zizinho, Bauer e Juvenal no segundo tempo, os periódicos atiraram a culpa da derrota em cima dos atletas negros e mestiços.

Saí do terreiro com a cabeça voltada em escrever uma crônica sobre a falta de respeito com os craques negros daquela Seleção. Mas o altruísta espírito de Barbosa continuou a me seguir e, onde quer que eu fosse ele estava lá, tentando me convencer de que não é um mártir, que eu deveria esquecer seu exemplo de vida e me concentrar em questões atuais.

Entre uma e outra aparição, Barbosa diz estar muito entristecido por não ter defendido o chute de Ghiggia e, mais ainda por presenciar do além-túmulo as manifestações racistas que insistem em assombrar o nosso futebol.

Ele, que nasceu numa época em que a discriminação racial tinha respaldo institucional e as circunstâncias do racismo no futebol eram dignas do sul do Mississipi, anda por aí, errante, onipresente e desfrutando dos privilégios de um mundo anti-material.

Sua força vital perambula (emitindo vibrações poderosas) sempre alerta, orientando espiritualmente os militantes negros do mundo inteiro, apreciando a cultura Hip-Hop, trabalhando como ativista engajado de Obama e se relacionando com outras almas perdidas, como a de Martin Luther King, com a qual discute as diretrizes cósmicas das posições políticas.

Em sono profundo, escrevi uma centena de notas sobre o tema ensejado, provavelmente sob a influência energética de Barbosa. Hoje, mergulhado em anotações que sequer possuem os traços de minha letra, vejo-me no dever de citar, na condição de um mero instrumento, algumas das posições firmes do ex-goleiro:

“... Infelizmente, se vende a imagem de que no Brasil o preconceito está desaparecido, ou então anda definhando, agonizando tão desprestigiado que, inclusive, anda sofrendo de preconceito...”.

“... No Brasil onde todos os dirigentes são brancos, todos os narradores são brancos, todos os cronistas são brancos, todos os jornalistas, técnicos e empresários são brancos e, por coincidência, os políticos também são brancos, estou chocado por acreditarem nisso...".

“... Não se comenta a integração dos negros no futebol como se faz, por exemplo, na universidade, na representação pública ou nas novelas, sem que ninguém conteste o motivo de não haverem presidentes de clube negros, médicos ou empresários negros...”.

“... Mesmo notando um notável avanço em relação ao passado recente, os negros ainda estão, na cabeça de muita gente, circunscritos à condição de craques, pagodeiros ou favelados...”.

“... Afirmações como “goleiros negros são pouco confiáveis” e “zagueiros brancos são melhores taticamente” são mais comuns do que se pensa...”.

“... Como a política e a cartolagem brasileira funciona à base de apadrinhamento e carreirismo nepotista, não vejo um futuro onde os negros estarão disputando a presidência da república ou mesmo da CBF...”.

“Enquanto tratarmos o racismo com palavras mais elegantes como problema social ou discriminação racial e, sem qualquer espanto continuarmos a utliziar costumeiramente a palavra denegrir (rebaixar, tornar negro), podemos acreditar que ele não anda mais vivo do que nunca, nas bases mais fundamentais de nossa sociedade?”.

Não Barbosa, não podemos. E, sem que a humildade de sua alma permitisse tal comentário pelas vias utilizadas, ainda sinto-me no dever de citar um fato histórico de extrema relevância, que você sequer mencionou: Em 1993, Barbosa foi proibido de entrar na concentração da Seleção brasileira para deixar seu incentivo. Zico, por outro lado, foi recebido com honra. E qual dos dois, diga-se de passagem, “amarelou” em mais em Copas do Mundo?

É o racismo, companheiros. Ele ainda está por aí, escancarado, nas
arquibancadas nos gramados e nas cúpulas administrativas do futebol.

O espírito de Moacir Barbosa aguarda no purgatório por uma justiça tardia, para com os atletas negros do mundo inteiro, apenas para poder seguir a luz e descansar em paz.

8 comentários:

Anônimo disse...

Olha só que boa lembrança: Barbosa integrou o famoso Expresso da Vitória, como era conhecido o time do Vasco daquela época(...) Seu chute era tão forte que, até hoje, no Chile, quando um goleiro cobra um tiro de meta e a bola vai muito, muito longe, o tiro se chama "a la barbosa"...

de fato, um dos melhores goleiros que o brasil já teve. Mereçe mesmo muito mais do que o pé frio do Zico

Anônimo disse...

Por que "amarelar"? Com os orientais, pode? Hahaha...

Anônimo disse...

hahahaha

por isso q a coisa não anda, ta vendo?

no Brasil, queira ou não, vc vota em branco e depois os caras amarelam. no final, a coisa fica preta...

Anônimo disse...

nessa hora deu branco no chicão

ou ele ta no vermelho ou ta abusando do verde.

relaxa. tudo azul.

Pausa Para A História disse...

Estou chocada! Tu escreves muito bem, muito mesmo! Parabéns! Já vi que terei aqui, um banho de talento e cultura!
Olha o meu Blog www.ahistoriadeumagata.blogspot.com
Beijos mil

Anônimo disse...

Sacanagem com os nipo-japa-brasileiros!

Sacanagem também com a bancada sírio-turco-libanesa da câmara, que não tem nada a ver com o voto em branco.

Anônimo disse...

ler todo o blog, muito bom

Anônimo disse...

Maracanazo...

A bola travessa
Acha brecha entre
A trave e o tronco
Travo amargo
Na vida do homem
Que ia morrer de desgosto.
Barbaridade da bola
Amante caprichosa
Matar assim o Barbosa.

(Rafael Fonseca Lemos - Curitiba/PR)